quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Ecologização do consumo: estamos no caminho certo?

De uns tempos para cá estamos acompanhando o crescimento significativo da consciência sobre a importância de relacionarmos nossos hábitos de consumo com os impactos que estes causam à natureza e à sociedade. Chamada a participar da batalha contra uma crise ambiental que coloca como uma possibilidade cada vez mais presente, a sociedade gradativamente tem modificado seus hábitos de consumo na tentativa de colaborar para garantir a qualidade ambiental e o futuro da humanidade. Nesse contexto, uma das soluções que tem sido posta aos consumidores é a mudança de seus hábitos de consumo: alternativas aos produtos convencionais, como carros flex, sacolas biodegradáveis, ecobags, papel reciclado, roupas confeccionadas com material orgânico ou reciclado, ao lado de novas práticas como reuso de papel, economia de água, energia elétrica, alimentos, entre outros, chega a nós como possibilidades de contribuição para, senão a melhoria, ao menos a neutralização do impacto da nossa presença no planeta.

Certamente, do ponto de vista da utilização de recursos naturais, essas atitudes tendem a gerar resultados. Menos recursos consumidos, mais recursos disponíveis.

No entanto, é preciso ponderar que esse é apenas um dos aspectos que influenciam as condições de sustentabilidade do sistema.  Existem outros.  A existência de bilhões de pessoas em condição de pobreza ou de miséria, que nem fazem parte ou participam parcialmente do universo do consumo do essencial para a sobrevivência, por exemplo, é um desses aspectos. Se agirmos em favor de reduzir, precisamos também agir para distribuir o que se economizou.

Um dos apelos das campanhas de redução do consumo de água, apenas para continuar citando exemplos, é o argumento de que o que se desperdiça poderia ser destinado a matar a sede de  pessoas que não tem. Mas como essa água economizada vai chegar a essas pessoas? Se pensarmos em água potável como uma possibilidade apenas àqueles que têm como pagar por ela, possivelmente o seu esforço irá “ralo abaixo” se não enfrentarmos a questão da efetividade concreta dos direitos humanos, que deve ser garantida a todos, independentemente das condições de se pagar por esse serviço. E o mesmo pode se dizer dos alimentos e da energia elétrica.

Outro exemplo é o uso do carro flex. Pode-se até ficar feliz por ajudar o planeta consumindo combustível de origem renovável, mas talvez não seja possível ficar tão felizes pensarmos no estresse causado pelos congestionamentos que crescem na proporção dos novos carros que são colocados nas ruas, e que, embora cada unidade polua menos, se aumentamos o número de fontes poluidoras, o resultado não será tão benéfico quanto se gostaríamos que fosse. Contar com um sistema de transporte coletivo eficiente e de qualidade, nessa situação, parece ser uma possibilidade muito mais efetiva.

E a tal da separação dos resíduos? Se não houver coleta seletiva ou uma cooperativa de catadores e recicladores para recolhê-los, ou ainda, se não houver interesse econômico suficiente para a reciclagem ou qualquer outra atividade de reuso, o destino deles não será outro senão virar lixo. Os exemplos são inúmeros e não teria muita utilidade ficarmos dissecando cada um. Mais útil, me parece, é reconhecer que todos eles possuem uma origem comum, que se enraíza numa crise que não é ambiental, mas social: a necessidade premente de nos reconhecermos como parte de um todo, um organismo vivo e dinâmico que não sobrevive apenas pela manutenção das partes, mas também pelo funcionamento dessas partes em favor do todo.

Reconhecer que a ecologização do consumo vai além do mero consumo do ecológico e que nossas escolhas de consumo não são mais que uma pequena parte da magnífica tarefa de nos alçarmos a um novo modelo de civilidade, em que o todo coletivo possa, efetivamente, ser mais que a soma das partes, me parece, essa é a verdadeira consciência, esclarecida, que ilumina não o consumidor, mas o cidadão. É desse sujeito que precisamos para viver num mundo melhor.

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